Porque a trovoada é mais frequente na primavera e no verão?
A trovoada é um fenómeno meteorológico associado a instabilidade atmosférica que consiste no surgimento de descargas elétricas atmosféricas num determinado local do planeta.
Devido à frição causada pelo movimento rápido e contínuo dos cristais de gelo presentes nas nuvens, durante uma trovoada geram-se descargas eléctricas para equilibrar a diferença de potencial entre o topo da nuvem (cargas positivas), a base da nuvem (cargas negativas) e o solo (carga positiva). A atmosfera funciona como um isolador entre a nuvem e o solo. Quando a energia envolvida numa tempestade ultrapassa a resistência do ar, gera-se uma descarga entre pólos de carga oposta. Esta descarga é caracterizada por um raio com temperaturas muito elevadas que aquecem o ar à sua passagem. O rápido aumento da pressão e temperatura fazem expandir violentamente o ar envolvente ao raio a velocidades superiores às do som, gerando-se uma onda de choque cujo som é denominado por trovão.

Para uma trovoada se formar é necessário que exista elevação de ar quente e húmido numa atmosfera instável. A atmosfera fica instável quando as condições são tais que o ar mais quente em ascensão pode continuar a subir porque continua mais quente do que o ar ambiente. A elevação do ar quente é um mecanismo que tenta restabelecer a estabilidade.
Do mesmo modo, o ar mais frio tende a descer e a afundar-se enquanto se mantiver mais frio do que o ar na sua vizinhança. Se a elevação de ar for suficientemente forte, o ar arrefece (adiabaticamente) até temperaturas abaixo do ponto de orvalho e condensa, libertando-se calor latente que promove a elevação do ar e “alimenta” a trovoada. Deste modo, formam-se núvens com grande desenvolvimento vertical chamadas de Cumulonimbus, que podem atingir altitudes entre os 12 e os 18 km de altitude alimentadas pelas correntes ascendentes de ar (ver Fig.1 em baixo).

Porque é mais comum nos meses mais quentes?
As trovoadas são fenómenos atmosféricos associados a nuvens do tipo Cumulonimbus, e a sua ocorrência está intimamente ligada a três factores fundamentais: calor, humidade e instabilidade atmosférica. É precisamente por isso que, em Portugal, estes fenómenos são mais comuns nos meses da primavera e do verão.
- Durante a primavera e o verão, os dias são mais longos e as temperaturas aumentam significativamente, sobretudo no interior do território. Este aquecimento solar mais intenso provoca a subida de ar quente e húmido à superfície, criando condições favoráveis à formação de nuvens convectivas.
- A instabilidade ocorre quando o ar quente e húmido à superfície sobe rapidamente e encontra camadas de ar mais frio em altitude. Esta diferença de temperatura entre os níveis baixos e altos da atmosfera favorece a formação de grandes nuvens de desenvolvimento vertical — os Cumulonimbus —, que podem originar aguaceiros fortes, trovoadas, granizo e até rajadas de vento fortes. Este tipo de instabilidade é particularmente comum na primavera devido à transição entre massas de ar frias e massas de ar quentes, gerando contrastes térmicos importantes. Mas no verão, há outro fator relevante.
- Durante os meses mais quentes, massas de ar tropical continental podem alcançar a Península Ibérica vindas do Saara ou do interior de Marrocos e Argélia. Estas massas de ar são muito quentes e secas à partida, mas ao atravessarem o Mediterrâneo ou ao interagirem com humidade local, podem tornar-se mais instáveis. Quando este tipo de massa de ar chega a Portugal, pode potenciar episódios de trovoada seca ou, em presença de humidade suficiente, gerar trovoadas intensas e de curta duração, muitas vezes acompanhadas por poeiras em suspensão e tempo muito abafado.
- A trovoada também depende da presença de humidade suficiente na atmosfera, essencial para alimentar o crescimento das nuvens. Na primavera, o solo ainda retém alguma humidade do inverno. No verão, além da influência marítima, a interação entre massas de ar tropicais e sistemas locais contribui para a formação de nuvens convectivas, sobretudo no Interior Norte e Centro, onde o relevo favorece o levantamento do ar.
Tendo em conta a distribuição espacial das cargas elétricas geradas numa tempestade, entre as nuvens e o solo, existem 3 tipos de raios: nuvem-nuvem, nuvem-solo e intra-nuvem. No 1º caso a descarga elétrica acontece em nuvens diferentes e é visível um raio horizontal; no 2º caso a descarga elétrica acontece diretamente da nuvem para o solo e é visível um raio vertical bem definido (são as descargas mais perigosas); no 3º caso a descarga elétrica dá-se no interior da própria nuvem e observa-se apenas um clarão sem surgimento do raio.
O IPMA possui uma rede de deteção e localização de Descargas Elétricas Atmosféricas (DEA) no território continental e nas áreas oceânicas adjacentes. É constituída por 4 detetores localizados em Braga, Castelo Branco, Alverca e Olhão que medem a intensidade dos raios e o tempo de chegada, utilizando antenas eletromagnéticas e relógio de precisão GPS. A informação registada por cada um dos detetores é transmitida instantaneamente para um centro de processamento, cujo resultado principal é o instante e local onde ocorreu o raio.
Artigo escrito por André Silva e André Frade, no dia 19/06/2025.